sábado, 16 de novembro de 2013

O VÖO DA GALINHA


Arnaldo Jabor - O Estado de S.Paulo
 
A extensa reportagem da revista inglesa The Economist sobre o Brasil devia servir como um programa de governo para a presidenta Dilma.

A revista é reconhecidamente a melhor do mundo em seriedade e profundidade de informação. No entanto, nossa raivosa e arrogante Chefa considerou a matéria uma espécie de oposição à sua administração cada vez mais 'bolivariana': "A revista está mal informada, etc." e repetiu os slogans que seus assessores petistas lhe sopram. É tão impressionante isso tudo. O tom geral da matéria deplora, lamenta que o Brasil, com todas as condições para uma decolagem, um 'take off', esteja jogando tudo para o alto, tanto pelo olho nas eleições quanto pela teimosia ideológica de enfiar o País dentro de um programa arcaico e inútil.
 Claro que os governistas acusarão a revista de "imperialista", de "neoliberal", de estar do lado das "grandes corporações" - o mesmo uso que fizeram sobre a espionagem americana na Petrobrás (será que descobriram por que a Petrobrás comprou uma refinaria no Texas por 1 bilhão e 200 milhões de dólares que não consegue vender nem por 100 milhões?).
 
Essa gente que está no poder bota sempre a culpa de nossa indigência em alguém de fora. Nosso amigo e líder Nicolás Maduro, da Venezuela, disse que a falta de papel higiênico, de comida e de energia é tudo culpa dos Estados Unidos. Seguimos sua linha.
 
Aliás, preparem-se para uma eventual reeleição da Dilma que, ao que tudo indica, vai partir para o bolivarianismo' explícito, como já declara o PT em seu site. Será que a nova Dilma vai se 'cristinizar' para a construção do 'socialismo imaginário' que justificou o 'mensalão'?
 
Na realidade, a revista, em seu artigo chamado Será que o Brasil se detonou?, praticamente só faz perguntas. "Por quê?" - pergunta a revista o tempo todo.
 
Por que, entre os países emergentes, nós temos o pior desempenho? Terá sido apenas um voo de galinha (chicken flight?), pois aproveitamos muito mal a enxurrada de dinheiro que entrou aqui nos últimos anos?
 Por quê? 
Por que o governo não ataca os problemas principais, enunciados por qualquer economista sério do mundo e se detém em remédios demagógicos, como buscar médicos medíocres em Cuba para fazer propaganda socialista nas cidades pobres, como o ridículo trem-bala, como os estádios bilionários para a Copa, que até nosso povo 'futeboleiro' condenou nas manifestações? 
Por que o famoso PAC, com seu 'desenvolvimentismo tardio' não consegue terminar nem 20% das obras propostas? 
Por que o governo não consegue privatizar (opa:'fazer concessões') nem rodovias, nem ferrovias, nem aeroportos, sem errar várias vezes, sem conseguir redigir contratos decentes, atraentes?
 Por que o rio S. Francisco continua parado, com grandes regos secos que o Exército fez? 
Por que não explicam à população as causas dos atrasos, em vez de gastarem bilhões em propaganda enganosa?
 Por que o número de carros dobrou em 10 anos e as estradas continuam podres e paralisadas?
Por que a China acaba de cancelar a compra de 2 milhões de toneladas de soja por causa da dificuldade do 'gargalo Brasil'? 
Por que a maior produção de soja no mundo fica na fila infinita de caminhões porque não há silos, detidos pela Bburocracia mais atrasada do planeta? 
Por que a inflação pode se descontrolar de novo? 
Por que contrataram mais de 100 mil pelegos para boquinhas no governo, em vez de cortar custos da atividade-meio? 
Por que estimular o consumo, sem estimular o aumento da oferta? 
Por que os preços no Brasil são o dobro de qualquer país do mundo, sendo que o chamado 'Big Mac Index', a ferramenta de comparação de preços, mostra que nosso Big Mac é 72% mais caro que em qualquer lugar e carros custam 45 mais caro que no México, EUA? "Ah... porque a carga tributária é de 36% do PIB e nos outros países semelhantes não passa de 21%." 
Então, por que não lutar por uma reforma tributária profunda, em vez de jogadas periódicas premiando uma ou outra atividade? Por quê? "Ah, porque é muito difícil passar no Legislativo..." Mas, por que não usar toda a força da maioria que têm para isso? 
Por que a agroindústria, tão esquecida pelo governo (que gosta mais do MST), nos salva todo ano com sua lucratividade? Será que vai bem justamente porque o governo não se meteu?
 Por que o SUS é a porta do inferno?
 Por que a educação zero está impedindo a produção nacional, sem mão de obra para nada?
 Por que temos o recorde mundial de analfabetismo funcional? 
Por que será que os investidores internacionais têm medo de vir para cá, ultimamente? Será que é porque eles sabem que nós mudamos regras,não respeitamos contratos nem marcos regulatórios e porque nós queremos lhes enfiar o Estado goela abaixo? 
Por que será que, de todo o dinheiro arrecadado para as aposentadorias no País, 50% é para pagar apenas 20 % dos aposentados (setor público, claro), enquanto a outra metade é para pagar os 80% restantes? 
Por que somente 1,5% do PIB é investido em infraestrutura,quando no resto do mundo é por volta de 4%? Por quê? Nossa infraestrutura é a 114 pior entre 148 países. 
Ou seja, continuamos sob 'anestesia mas sem cirurgia' (Simonsen). Por quê?
Talvez a resposta esteja em Platão e sua carroça. Ele disse que é dificílimo guiar um carro com dois cavalos diferentes - um bom marchador e outro manco e lento. É nosso destino, em um governo dividido entre o 'bolivarianismo' e as necessidades óbvias, reais do País. Ao contrário do que proclamam, o óbvio pragmatismo administrativo não é 'de direita' não, e seria bom para o crescimento e para reduzir a desigualdade.
A matéria do The Economist tem a boa intenção de nos acordar para a racionalidade; não quer nos destruir, não é da 'oposição'. A reportagem da revista, que é lida no mundo inteiro, serve para nos lembrar da famosa
frase de Reagan (sim, o reacionário) - perfeita para nos definir: "O Estado não é a solução; o Estado é o problema".

Ah, sim; a revista esqueceu de mencionar uma importante força da natureza que nos impele para o erro: a muito esquecida categoria política da...Burrice.

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